Governo diz ter encontrado remédio com eficácia de 94% contra coronavírus em testes de laboratório, mas não divulga nome

 Governo diz ter encontrado remédio com eficácia de 94% contra coronavírus em testes de laboratório, mas não divulga nome

O Ministério da Ciência e Tecnologia informou ter encontrado dois remédios que reduzem a replicação do novo coronavírus em células humanas, sem causar efeitos colaterais. Um desses remédios teve eficácia de 94%. Os testes foram feitos em laboratório e serão replicados em 500 pacientes nas próximas semanas. O nome dos remédios, no entanto, não será divulgado antes dos resultados dos testes para que não haja corrida a farmácias.

De acordo com o ministério, o remédio tem baixo custo, incluindo genérico, e tem ampla distribuição no território. O anúncio foi feito pelo ministro Marcos Pontes durante coletiva no Palácio do Planalto. A expectativa dele é que o resultado dos testes seja divulgado até a metade de maio.

— No máximo na metade de maio, um momento crítico, nós teremos aqui uma solução de um tratamento, se Deus quiser, estou contando que esses testes clínicos realmente demonstrem a eficiência desse remédio, a probabilidade maior é essa. Considerando isso correto, a gente vai ter um tratamento com um remédio que não tem praticamente efeitos colaterais — disse Pontes.

Não há, no entanto, evidências científicas sólidas de uma medicação eficaz contra a Covid-19 registradas no mundo. Um levantamento encomendado pela Associação Médica Americana (AMA) e conduzido pela Universidade do Texas (EUA) avaliou mais de 100 testes clínicos de remédios contra o Sars-CoV-2 e “nenhuma terapia se mostrou efetiva” nestes quatro meses, segundo o estudo publicado na revista JAMA, o periódico da associação.

Os pesquisadores testaram inicialmente, pelo computador, dois mil medicamentos e encontraram seis substâncias consideradas promissoras. Esses seis remédios foram testados em células infectadas com o coronavírus e dois deles reduziram a replicação viral.

Os testes clínicos serão realizados em sete hospitais: cinco no Rio de Janeiro, um em São Paulo e outro em Brasília. Nem os pacientes nem os médicos saberão qual remédio estarão utilizando.

— O médico vai receber a medicação, o placebo ou a medicação propriamente dita, e o paciente vai receber a medicação. O médico não sabe… É claro que tem um corpo que vai fazer isso, anterior ao recebimento do medicamento ou do placebo, e o médico de forma “randomizada” (aleatória) vai aplicar esse medicamento ou placebo nesses pacientes. Depois de todo o protocolo clínico realizado, isso é desvendado, e a gente sabe se houve eficiência ou não do medicamento — explicou o secretário de Políticas para Formação e Ações Estratégicas do ministério, Marcelo Morales.

O paciente receberá o medicamento durante cinco dias e será monitorado, no total, por 14 dias. O público que receberá será amplo.

— Vai ser amplo e a partir dos 18 anos. É o paciente que chegou com pneumonia, com tosse seca, febre e aquela característica da tomografia em vidro fosco. Ele não é tão grave, mas ele está com sintomas da Covid — disse o secretário.

Testes com inteligência artificial

Marcos Pontes também anunciou duas alternativas para suprir a ausência dos reagentes necessários para a realização de testes para coronavírus no Brasil. A primeira delas é a fabricação de um reagente nacional, em um laboratório da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

— Eles desenvolveram nessa unidade um reagente nacional que tem exatamente a mesma performance dos reagentes importados para esses testes diagnósticos — explicou. 

Outro anúncio foi um teste feito com inteligência artificial, que não precisa de reagentes.

— Temos uma outra alternativa que não precisa de reagente. É um equipamento, e esse equipamento utiliza inteligência artificial. Ele faz a iluminação por laser da saliva da pessoa que está sendo testada. Uma amostra de saliva que é iluminada por laser, e por isso a inteligência artificial consegue detectar a presença ou não da Covid — disse. — Ele consegue realizar em um minuto o resultado. É um teste rápido, preciso e sem reagente.

Segundo o ministro, esse equipamento poderá estar disponível em até 20 dias, com a capacidade de realizar 500 mil testes por dia:

— A máquina já existe, a inteligência artificial está sendo calibrada neste momento. Temos capacidade de, em 20 dias, colocar um número considerável destas máquinas, não sei o numero ao certo. Estas máquinas conseguem fazer 500 testes por dia. Se a gente pega mil máquinas dessas, são 500 mil testes por dia. Existe essa capacidade de se ter essas mil máquinas.

Especialistas veem resultados com cautela

Segundo especialistas, os resultados desses testes são preliminares e têm de ser vistos com cautela.

– É uma esperança, mas (o resultado) é precoce demais para depositarmos muitas expectativas nisso – diz Guilherme Werneck, infectologista da UFRJ. – Que bom que foi descoberto, que bom que vai poder ser testado. Mas é preciso continuar pesquisando outras drogas e em outras frentes, porque a chance de não dar certo é muito grande.

É possível um remédio apresentar resultados promissores in vitro e falhar nos testes em pessoasl?

Segundo Werneck, esse é o desfecho da maioria das substâncias avaliadas em estudos clínicos. In vitro, a aplicação acontece sob condições controladas, que podem não se manter dentro do corpo humano, explica o médico.

Ele diz ainda que o sucesso de um remédio em organismos depende de vários fatores, como o nível de segurança da substância, isto é, sua capacidade de causar efeitos colaterais graves, e o volume da dose necessária para neutralizar o patógeno. Se ela for muito grande, também pode trazer complicações severas.

– É preciso saber se a dose usada nos testes in vitro desse remédio foi a dose normal. Se sim, muito bom. Sinal de que você não precisa de doses cavalares da substância para se tratar – diz Werneck, que completa: – Na verdade, o que queremos é um medicamento que combata a infecção antes de ela se complicar. Não podemos esperar a pessoa desenvolver uma pneumonia para tratá-la.

Werneck lembra ainda que, no caso de uma medicação aprovada e comercializada, o processo de testagem tende a ser menos problemático, pois já se conhece o nível de segurança da substância. E também é mais curto, porque prescinde das etapas de identificação e sintetização da droga.

Tânia Vergara, infectologista da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), lembra que os estudos precisam ser autorizados por comitês de ética. Nesta quarta-feira, o ministro Marcos Pontes anunciou que os testes clínicos foram autorizados na véspera pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).

A médica também explica o processo de testes, que tem quatro fases principais. A primeira avalia a segurança do medicamento, investigando os efeitos colaterais relacionados à dose. Em se tratando de um remédio conhecido, se a dose proposta para o novo uso for a mesma da já aprovada, essa fase pode ser dispensada. Em seguida, na segunda fase, testa-se a eficácia do medicamento, com aplicação randomizada em grupos de pacientes. É a etapa em que se encontra a medicação proposta pelo MCTIC.

– Os melhores estudos são os cegos, quando nem paciente nem médico sabem se o paciente está usando o medicamento ou o placebo – diz a médica.

A terceira fase expande o estudo para um número grande de pacientes. Se o grupo da intervenção tiver um desempenho superior ao grupo placebo, todos os pacientes passam para o grupo da intervenção. A fase quatro se baseia na vigilância dos efeitos pós-comercialização.

Vermífugo

No fim da tarde desta quarta-feira, na coletiva à imprensa diária do Ministério da Saúde, o ministro da pasta, Luiz Henrique Mandetta, disse que a equipe de Pontes testa um vermífugo contra Covid-19. A declaração foi feita quando Mandetta citava estudos em andamento sobre a doença, incluindo a cloroquina.

De acordo com Mandetta, a cloroquina se mostrou interessante in vitro, com grande capacidade de matar o novo coronavírus, o que não tem se repetido ao ser testado em humanos, segundo as pesquisas. Da mesma forma, o vermífugo teria se mostrado promissor em laboratório e agora será experimentado em pacientes com Covid-19.

Na semana passada, Mandetta já  havia mencionado ter recebido informações de pesquisas sobre um remédio, chamado ivermectina. Ele disse, na ocasião, que é usado para tratar gado, matar carrapato e deixar o pelo do animal bonito. O medicamento, segundo Mandetta afirmou, poderia ser promissor para tratar o novo coronavírus.

* Colaborou Rodrigo de Souza, estagiário sob orientação de Flavia Martin

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