Ex-piloto de Fórmula-1 que perdeu as pernas em acidente busca bicampeonato paralímpico no ciclismo
Nada é capaz de parar o italiano Alex Zanardi. Não foi o acidente automobilístico sofrido há 15 anos, que o deixou sem as duas pernas, nem será a idade: em outubro, ele completará 50 anos. A vitalidade é a do mesmo menino de 13 anos que pilotou um kart pela primeira vez. Assim como a paixão pela velocidade e pelo desafio, que é capaz de fazê-lo participar de uma Paralimpíada em um mês e competir o Ironman no outro.
A partir da próxima quarta-feira, ele defenderá os ouros conquistados em Londres na corrida de estrada e contrarrelógio, na categoria H5 — atletas paraplégicos e amputados que podem usar os joelhos na bicicleta de mão. No início de outubro, competirá na etapa de Kona, no Havaí, uma das 12 do Ironman, o olimpo dos triatletas. Será a terceira participação do italiano na prova que consiste em quase 4km de natação, cerca de 200km de ciclismo e uma maratona. Está nos planos para o futuro se aperfeiçoar no triatlo.
— O que eu amaria fazer é pesquisar e aprender mais sobre triatlo, quero tentar melhorar meu tempo em Kona — disse Zanardi, que fez as três provas em 9h40m37s no ano passado, sendo duas sobre a bicicleta adaptada para as mãos e cadeira de rodas.
Tanta vitalidade só foi ameaçada realmente pelo gravíssimo acidente no GP da Alemanha, em 2001, da Fórmula Cart, dissidência da Indy. Num primeiro momento, Zanardi admitiu que preferia não ter sobrevivido às cirurgias e às paradas cardíacas sofridas. O pensamento de tirar a própria vida esteve presente na recuperação. Como tudo na história dele, foi rápido. Recuperado, voltou ao esporte, em carros adaptados na categoria Turismo, na qual competiu de 2003 a 2009.
Porém, a inspiração maior foi o movimento paralímpico. Um artigo de Clay Reggazoni, que também sofreu grave acidente automobilístico, o fez se inscrever para maratonas de cadeiras de rodas. Logo depois veio o primeiro contato com o paraciclismo. Zanardi substituiu os 300km/h, 400km/h das pistas de Fórmula Indy e de Fórmula 1 (competiu nos anos 1990), pelos 40km/h das bicicletas. Cinco anos depois, o auge da nova carreira: três medalhas olímpicas, duas de ouro e uma de prata (por equipes), em Londres-2012. Na conta do campeão ainda estão três títulos mundias consecutivos, de 2013 a 2015, nas três provas. Mais um Mundial de Paraciclismo está na lista do atleta para o futuro.
— Com certeza vou participar do Mundial e de algumas provas da Copa do Mundo — garantiu o italiano, que não vai abandonar as pistas de automobilismo. — Penso em voltar para as corridas de carro no ano que vem, também é a minha paixão. Eu tenho possibilidades de voltar e quero repetir as 24 horas de Spa Francorchamps (na Bélgica). Corri no ano passado e foi uma experiência fantástica. Eu estava muito bem na corrida, mas tive um problema faltando uma hora para acabar. Então seria fantástico voltar a Spa e poder terminar a corrida com um bom resultado.
O automobilismo está sempre presente na história de Zanardi, que foi bicampeão da Cart, em 1997 e 1998, pela Chip Ganassi. No paraciclismo, em Londres, ele conquistou a medalha no contrarrelógio no autódromo de Brands Hatch, onde já havia pilotado algumas vezes, mas sem nunca ter vencido.
No Rio, ele retorna à região próxima de onde um dia existiu o Autódromo de Jacarepaguá para disputar as provas no Pontal. Nos anos 1990, o então piloto da Cart participou de três GPs. O mais emblemático foi o de 1998, ano do seu bicampeonato da categoria.
Zanardi dominou boa parte da prova, fez a volta mais rápida da Rio 400, mas, numa disputa acirradíssima com Greg Moore, perdeu o primeiro lugar para o canadense.
— Minha primeira pole na Cart foi aqui… Em 1998, foi por pouco. Acho muito romântico poder voltar, não no mesmo circuito, mas competir no lugar próximo. Vai ser muito legal. Lá na Itália somos muito supersticiosos, sei que aqui vocês também são — brincou.
Zanardi não é um saudosista, mas já mostrou que está acostumado a refazer história por onde passa. Em 2003, dois anos após o acidente que lhe custou a mobilidade, voltou ao circuito de Lausitzing e pilotou um carro adaptado, semelhante ao seu Honda/Reynard, completando as voltas que faltavam no momento do choque com o canadense Alex Tagliani.
— Na minha mente, foi como se eu tivesse terminado aquela corrida. Não vivo do passado, mas trago muitas coisas dele que me dão orgulho.
Zanardi é do tipo que não olha para trás e não se lamenta por pouco. No Rio, ele terá um novo desafio: ser melhor do que os outros numa estrada plana. O italiano é especialista em corridas com subidas, como em Londres. Porém, ele garante que está preparado. Da mesma forma que soube desacelerar dos 400km/h para os 40km/h sem perder a paixão pela velocidade.