‘Compra da 99 por chineses é quebra de hegemonia da Uber’, diz diretor da Cabify
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Daniel Bedoya, presidente da Cabify no Brasil
A compra da brasileira 99 pela chinesa Didi Chuxing mostra que o reinado hegemônico da Uber no mercado de aplicativos de corrida ficou para trás. A opinião é de Daniel Bedoya, 28, diretor para o Brasil da espanhola Cabify.
O preço pago pela Didi não foi revelado, mas o negócio avaliou a 99 em mais de US$ 1 bilhão.
A Cabify buscará ser uma terceira via na disputa entre gigantes que se avizinha.
Em entrevista no escritório da empresa, o peruano Bedoya afirma que o setor de mobilidade precisa de mais opções além das corridas baratas oferecidas pelas rivais.
Espera que a Cabify mantenha seu espaço no mercado atendendo nicho que busca garantia de maior qualidade e segurança. Quer fazer isso sem entrar em guerra de preços, como a ocorrida em 2017.
A companhia se juntou à brasileira Easy, do mercado de táxis, em 2017. Segundo Bedoya, o segmento também vem crescendo após ser superada a aversão aos carros de praça que surgiu nos primeiros anos da Uber.
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Folha – Como o sr. recebeu a notícia da compra da 99 pela Didi?
Daniel Bedoya— Já era algo esperado, levando em conta os movimentos que aconteceram o ano inteiro [a companhia chinesa liderou investimento de US$ 100 milhões na 99 em janeiro de 2017].
Isso mostra uma quebra de hegemonia de um grande player, que era a Uber. O mercado era muito tendencioso para ela. Desde o ano passado, ficou claro que ele também seria de outras empresas.
Após essa injeção de capital, o sr. espera nova guerra de preços para atrair clientes?
Em 2017, motoristas e passageiros aproveitaram muitos descontos para rodar a cidade. Nos próximos meses, acho que não dá para esperar tanta campanha de desconto.
O maior investidor de Uber e Didi é o mesmo player [o conglomerado japonês Softbank], o que mostra um movimento em direção à consolidação do mercado. Também abre a possibilidade de que ele passe a controlar mais as ações dos dois para não gastar dinheiro só por gastar.
O que permitiu que outros competidores encontrassem seu espaço?
O transporte é igual ao resto da economia tradicional. Há vários perfis de consumo. A forma como ele foi tratado desde o modelo de táxis, no Brasil e no mundo, foi para suprir dois tipos de transporte: o barato, que é o foco da Uber, e a conveniência, no caso do táxi.
Mas ao definir o mercado assim não considera todas as possibilidades de consumo. Na hora em que entende que há pessoas querendo ir do ponto A ao ponto B com mais segurança, outros com mais velocidade, o mercado se abre.
Como vocês buscam seu espaço nesse mercado?
Nós nos posicionamos em um nicho específico, que busca segurança e qualidade no transporte. Isso não impede nosso crescimento. Mas não nos permite ter o mercado inteiro, é verdade. Essa não é nossa estratégia agora.
Vocês já tentam tornar o negócio lucrativo ou irão seguir investindo para crescer?
Estamos captando investimentos. Temos operações que se pagam, mas buscamos recursos continuamente, pois sabemos que tamanho e relevância são importantes nesse mercado e que ele está em expansão.
Mas nossa visão é diferente da dos outros players, olhamos o mercado a longo prazo. Como sabemos que ele não vai sumir, não preciso resolver ele em um ano ou dois.
Entendemos que Uber e 99, dentro da estratégia deles, estão certos. Eles atuam como varejo, onde o que importa é preço e disponibilidade. Não estamos no segmento e não esperamos entrar nele agora. A Cabify trabalha num nicho, num mercado segmentado.
Uma boa experiência para o cliente depende de cultura, inteligência e marca, coisas que dificilmente se replica. Entramos no mercado nos blindando com esses atributos. Os outros podem tentar fazer isso, mas têm uma outra cultura e forma de executar.
Ao mesmo tempo em que buscam diferenciação, imitam ferramentas dos outros apps, como o preço dinâmico (o preço sobe quando a demanda supera oferta). Não há o risco de ficarem todos iguais?
Adotar o preço dinâmico para melhorar a oferta de motoristas não significa que estou tirando meu diferencial competitivo. Ferramentas tecnológicas como preço fixo, dinâmico, prever a viagem antes de o cliente pedir não são os diferenciais competitivos mais importantes.
Existe uma tendência de commoditização de tecnologia. Qual empresa aérea dá uma experiência totalmente diferente na compra eletrônica da passagem?
O que conta é como o serviço é diferenciado durante o transporte. O resto é totalmente replicável. Se faço uma ferramenta inteligente, Uber e 99 vão copiar. Se a deles é boa, nós vamos.
Em 2017, a Cabify adquiriu a Easy. Como vê o mercado de táxis hoje?
O mercado de táxi voltou a crescer. Houve momento de aversão ao táxi. Agora, as pessoas usam táxis e corridas com motoristas particulares, dependendo da necessidade.
É possível que aconteça uma unificação entre as duas marcas neste ano?
Vou dar minha opinião pessoal. Acredito ser melhor ter marcas diferentes atacando cada segmento. Marca é algo muito específico para estilos de consumo diferentes.
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RAIO-X
Formação: Nascido no Peru, é graduado em engenharia agronômica pela Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), da USP, possui mestrado em administração pela faculdade de economia da mesma universidade
Atuação: Criou a empresa Caronas.com em 2014 e foi presidente da Tripda, do mesmo setor, até 2016, ano em que assumiu o comando da Cabify no Brasil
Folhapress