Como o desgaste de Bruno Reis fortalece Jerônimo e enfraquece ACM Neto

As pesquisas da AtlasIntel com a avaliação dos governadores e prefeitos das capitais brasileiras revelam um processo consistente de erosão do capital político do prefeito Bruno Reis, em Salvador, crescimento da avaliação positiva de Jerônimo Rodrigues, na Bahia, com implicações diretas para a campanha de ACM Neto nas eleições de 2026.
Na análise que fizemos no LabCaos destacamos um paradoxo: a avaliação do governador Jerônimo Rodrigues melhora na Bahia enquanto a gestão municipal de Salvador entra em desgaste, corroendo a imagem de eficiência que historicamente serviu de vitrine ao grupo de ACM Neto. Em termos maquiavelianos, trata-se de um príncipe local que perde o controle da fortuna (o contexto) ao mesmo tempo em que seu adversário amplia a virtù (capacidade de agir estrategicamente) no tabuleiro estadual.
Maquiavel advertia que “não há nada mais difícil de empreender, nem de êxito mais duvidoso, do que a introdução de uma nova ordem de coisas”. A queda de Bruno Reis no ranking nacional de prefeitos indica que a “ordem” de Salvador como vitrine administrativa da direita baiana entrou em xeque, abrindo espaço simbólico para a narrativa petista de que o ciclo mudou no estado.
Os dados da AtlasIntel mostram que Bruno Reis caiu de 3º para 10º lugar no ranking de aprovação de prefeitos de capitais entre 2024 e 2025, com a avaliação pessoal despencando de 79% para 56% em apenas um ano. Ao mesmo tempo, apenas 27% da população considera sua gestão ótima ou boa, enquanto 57% classificam como regular e 15% como ruim ou péssima, sinalizando um esvaziamento da aura de excelência administrativa que sustentava seu prestígio.
Pierre Bourdieu descreve o capital simbólico como a forma de crédito político que se apoia em reputação, confiança e reconhecimento social; ao perder sete posições no ranking e ver sua gestão estacionada na zona do “regular”, Bruno assiste à conversão de prestígio em vulnerabilidade. Em termos eleitorais, “regular” tende a ser terreno ambíguo, mas, em contexto de polarização e memória recente de alta aprovação, funciona como porta de entrada para a crítica e para a comparação desfavorável com o governo estadual.
Os cruzamentos demográficos da pesquisa revelam que a reprovação é maior entre mulheres, jovens, eleitores com maior escolaridade e segmentos de classe média – grupos centrais para a construção de narrativas de futuro e de justiça social na cidade. As mulheres, que concentram a experiência cotidiana dos serviços de saúde e educação, expressam maior insatisfação, enquanto a juventude “sem perspectiva na capital” concentra o maior volume de rejeição, indicando um déficit de projeto geracional na gestão.
Quanto maior o nível educacional, maior a rejeição ao prefeito, e a classe média – historicamente decisiva nas urnas em Salvador – também passa a rejeitá-lo, segundo a pesquisa. Se, como lembra Maquiavel, “o modo mais seguro de dominar uma cidade acostumada à liberdade é destruí-la ou habitá-la”, o afastamento gradual desses grupos sugere que a coalizão sociopolítica que sustentava o projeto de ACM Neto na capital está se esgarçando por dentro.
Efeito Jerônimo e o desgaste da vitrine de ACM Neto
Enquanto a posição de Bruno Reis declina, o governador Jerônimo Rodrigues sobe duas posições no ranking nacional de governadores da AtlasIntel e passa a ter gestão avaliada como ótima/boa por 40%, contra 27% de Bruno, criando um contraste público diretamente explorável na disputa de narrativas. O próprio relatório assinala que o “resultado catastrófico” de Bruno coloca em xeque o principal argumento de ACM Neto: a ideia de que a gestão de Salvador seria modelo para a Bahia, referência de boa governança frente aos governos petistas.
Ao analisarmos a série histórica das votação para o Governo da Bahia, nos últimos 20 anos, identificamos que os governadores do PT na Bahia costumam crescer na reeleição: Jaques Wagner e Rui Costa ampliaram seus percentuais de votos válidos em torno de 16 pontos, com Rui alcançando 75,5%, a maior votação da história baiana. Com base nessa média, a projeção do LabCaos indica possibilidade de o PT chegar a cerca de 68,75% dos votos válidos em 2026, caso o padrão se repita, reforçando a hipótese de consolidação do ciclo petista e de enfraquecimento da influência de Salvador como centro irradiador da oposição estadual.
Na leitura de Maquiavel, o governante prudente precisa antecipar tempestades políticas e agir quando “os males ainda são fáceis de curar, mas difíceis de reconhecer”. Os números da AtlasIntel funcionam como um diagnóstico antecipado: a queda acelerada de Bruno Reis, somada ao crescimento de Jerônimo Rodrigues, sinaliza que a frente liderada por ACM Neto entrou em zona de risco estrutural, não apenas conjuntural.
Para União Brasil, preservar Bruno Reis como principal fiador da narrativa de competência administrativa pode significar insistir em um “teto de vidro”: uma vez que o prefeito da capital baiano é o principal defensor e referência política de Neto, mas agora sem o respaldo de um capital popular robusto. Para o PT, ao contrário, o cenário oferece oportunidade de reconfigurar o imaginário político baiano: se Salvador deixa de ser vitrine da oposição, o governador passa a disputar também o terreno simbólico da capital, articulando políticas públicas e comunicação política capazes de capturar a insatisfação de juventude, mulheres e classe média com a gestão municipal.
Yuri Almeida é estrategista político, professor e especialista em campanhas eleitorais
