Eleições sem disputa: a campanha para prefeito em cidades com candidato único

 Eleições sem disputa: a campanha para prefeito em cidades com candidato único

Enquanto mais de 16 mil candidatos gastam a voz, sola de sapato e dinheiro em disputas pelo cargo de prefeito neste ano no Brasil, a situação é mais tranquila para postulantes em 97 cidades de 13 Estados, onde apenas uma pessoa concorre ao posto.

Em Miraselva, município de 1,8 mil habitantes no norte do Paraná, eleitores já se acostumaram ao marasmo nas eleições municipais. É o terceiro pleito consecutivo em que apenas um candidato tenta a prefeitura.

Quem concorre desta vez é Celso Antiveri (PSDB), que já comandou a cidade em duas oportunidades (2001-2004 e 2005-2008). O atual prefeito, João Carlos Ferrer (PTB), está no segundo mandato.

Como a eleição do tucano é praticamente garantida, o município irá completar, ao fim do próximo mandato, 20 anos sob o comando de dois prefeitos do mesmo grupo político. Muitos eleitores reclamam da falta de opções.

Carlos Luiz Martins dos Santos, 53 anos, trabalhador rural desempregado que vive de diárias desde que foi dispensado de uma usina de cana-de-açúcar, disse que gostaria de poder escolher. “Não é interessante ter apenas um candidato”, afirmou, em conversa com a BBC Brasil na praça da cidade.

“Somos eleitores sem opções”, afirmou a comerciante Edneia Zanelato, 34, que trabalha em um bazar ao lado da prefeitura, que funciona em uma casa modesta e carente de reformas.

Desistência

O vereador Pedro Tolovi (PMDB), 63, chegou a fazer articulações para disputar a prefeitura contra Antiveri – os dois já haviam se enfrentado em 2004. “Desisti porque todas as pesquisas eleitorais o mostravam muito à frente. Além disso, não consegui montar um grupo.”

No confronto de 12 anos atrás, o candidato do PSDB teve 83,4% dos votos válidos. Neste ano, reuniu oito partidos em sua coligação: PSDB, PTB, DEM, PPS, PP, PMDB, PSB e PSC.

Questionado se a eleição de candidato único não é ruim para o município, o vereador que desistiu de concorrer relativizou a situação. “Por um lado é bom: não se gasta tanto dinheiro e também não se divide a cidade. Além disso, ele (Antiveri) foi um bom prefeito.”

Tolovi acabou se candidatando à reeleição na Câmara. Mas não seria um prefeito melhor do que o candidato? “Na minha cabeça, sim”, responde com um sorriso.

Mesmo sem adversários, Celso Antiveri está em plena campanha. Não é difícil encontrar carros com o nome dele pelas ruas de Miraselva. Investiu R$ 1,7 mil do próprio bolso e pretende injetar mais recursos nas últimas semanas antes das eleições.

“A propaganda é mais para ajudar os candidatos a vereador, mas também quero que votem em mim. Estou visitando todo mundo. Como a cidade é pequena, tem eleitor que fica magoado se a gente não passa para tomar um café”, afirma.
Produtor rural e com patrimônio declarado de R$ 2,3 milhões, o candidato diz que concorre porque “a política está no sangue”. O pai dele também comandou o município. O salário de prefeito de Miraselva é de R$ 8,1 mil.

Sobre os principais desafios à frente, o provável futuro prefeito cita a geração de empregos – todos os dias ao menos três ônibus e três vans saem de Miraselva levando trabalhadores para outras cidades da região.
O saneamento básico é outro problema. O serviço de abastecimento de água é municipal e não há rede de esgoto. Questionado se essas obras já não poderiam ter sido feitas em seus mandatos anteriores, Antiveri disse que “não tinha dinheiro”.

A receita total de Miraselva para 2016 é de R$ 11,9 milhões. De cada R$ 10 dos cofres municipais, R$ 7 vêm do governo federal, por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é considerado alto: 0,748, muito próximo da média do Paraná, que é 0,749.

Basta um voto

Pela legislação brasileira, para que um candidato único seja eleito em municípios com menos de 200 mil habitantes, basta que vote em si mesmo. Isso porque precisa da maioria dos votos válidos. Brancos e nulos não são considerados.
Em Miraselva, portanto, é tanta tranquilidade que o próprio candidato reconhece: “Perde um pouco da graça.”
Disputa mesmo na cidade somente para as nove vagas de vereador na Câmara Municipal. Há 24 interessados – 2,6 candidatos por cargo.

E há uma tradição na cidade: todos que se elegem “fecham com o prefeito”. “É que aqui somos muito unidos”, explicou um candidato que tenta o quinto mandato como vereador e preferiu não se identificar.

Barbada gaúcha

O Rio Grande do Sul é o Estado brasileiro com mais cidades com candidato único nas eleições de 2016. Não haverá disputas em 32 cidades gaúchas.

Em Mato Queimado, município de 1.789 habitantes no noroeste do Estado, a situação é assim há quase 20 anos: desde 2000, primeiro pleito após a emancipação, só concorrem candidatos únicos.

O candidato atual é Orlando Thomas (PP), 47 anos. Professor da rede municipal e produtor rural, já foi vice-prefeito na gestão 2008-2012.

Thomas conta que é tradição, desde a emancipação, que os dirigentes dos quatro partidos com diretórios em Mato Queimado – PP, PMDB, PTB e PT – se reúnam para chegar a um consenso sobre um nome para ser prefeito, evitando disputas.

O protagonista da eleição diz considerar a situação positiva para o município. “Basta ver a cidade para constatar que este modelo está sendo bom. Nossa infraestrutura é ótima”, afirmou.

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do município é considerado alto: 0,717. O do Rio Grande do Sul é 0,746. Mas, como a paranaense Miraselva, não há rede de esgoto por lá.

De colonização gaúcha e com a base da economia na produção de milho, soja e trigo, a cidade por pouco não ficou sem opções também para a Câmara. São apenas dez candidatos para nove vagas.

Thomas investiu R$ 1 mil na campanha e diz estar conversando com todos os eleitores. Afirma que terá como prioridade atrair indústrias e melhorar a saúde pública, que já considera muito boa.

Ele irá receber a prefeitura de Nelson Hentz, também do PP. E o lema da campanha não poderia ser outro: “Continuar para avançar.”

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