Em campanha presidencial polarizada e de período curto, tempo de televisão perde relevância

 Em campanha presidencial polarizada e de período curto, tempo de televisão perde relevância

Alvo de cobiça dos candidatos políticos, o tempo de televisão não tem mostrado impacto tão relevante nesse ano como em campanhas anteriores. No cenário presidencial, Geraldo Alckmin, que conta com 5 minutos e 32 segundos de TV e rádio, não consegue deslanchar nas pesquisas. Há casos de transferência de voto bem sucedidos, principalmente nas disputas estaduais, mas segundo especialistas, o curto tempo de campanha e a polarização do pleito atual, que carrega muitos votos emotivos, foram fatores que diminuíram o poder de penetração das propagandas televisivas.

Um levantamento do GLOBO mostrou que os os gastos com a produção de conteúdo para televisão, rádios e vídeos, consumiu 54,9% das despesas contratadas pelos presidenciáveis nos primeiros 20 dias do horário eleitoral gratuito. Os 13 cabeças de chapa (inclusive Lula, antes de ser declarado inelegível) despenderam R$ 67,9 milhões com propagandas do tipo. Em valores absolutos, quem mais investiu foi Henrique Meirelles (MDB), R$ 24,7 milhões. Segundo as pesquisas, ele está tecnicamente empatado com Cabo Daciolo (Patriota), que declarou gastos de R$738, nada em televisão e rádio, e com João Amoedo (Novo), que prometeu acabar com horário eleitoral gratuito de TV e rádio, caso seja eleito. Já o líder das intenções de votos, Jair Bolsoonaro (PSL), tem apenas oito segundos no horário eleitoral e gastou R$240 mil em produção de conteúdo.

O professor de marketing política da ESPM, Eugênio Giglio, enxerga dois fatores principais para a queda do impacto da televisão na disputa presidencial: o tempo curto de campanha e a polarização da disputa, que resulta em votos com carga mais emotiva do que debate de programas.

— A TV nesse ano tem menos tempo para fazer efeito. Além de competir cada vez mais com as “segundas telas”, de celular, computador, tablet. Programa eleitoral nunca despertou muito interesse, o efeito era mais pela massificação, ficava mais de um mês bombardeando informação, aí uma hora pegava. O segundo fator principal é que essa é uma campanha especialmente diferente, muito polarizada. O PT sempre teve engajamento forte, partido de paixão e mobilização. Do outro lado o Bolsoaro desperta paixão e ódio. Os dois polos trazem o voto muito emotivo — explica Giglio.

O professor analisou algumas candidaturas específicas. No caso do PT, a propaganda televisiva é importante, já que a chapa tem o segundo maior tempo entre os candidatos. Ciro Gomes e Bolsonaro, por outro lado, conseguem bons desempenhos a despeito da estrutura de mídia.

— O Meirelles tem tempo forte, mas não tem carisma e ainda carrega a cruz da impopularidade do Temer. O PT sempre teve mobilização de rede e o movimento do Bolsonaro, mesmo que pequeno no início, sempre foi sólido. A radicalização do discurso dele unia mais sua base. Já o PSDB perdeu tempo, esperava-se que o Alckmin fosse melhor, mas teve a briga entre ele e Dória pela candidatura e discussões internas sobre realização de prévias. Enquanto isso, Bolsonaro ia rodando o Brasil e pregando. E o próprio noticiário foi mais movimentado que a propaganda eleitoral. Por diferentes motivos foi mais dinâmico.

Para Roberto Gondo, professor de Comunicação Política da Universidade Mackenzie, o tempo de televisão ainda é um fator que ajuda os candidatos, mas é preciso observar o contexto da disputa. Ele explica que Alckmin, apesar de contar com muita mídia, começou a disputa já atrás de três, quatro candidatos.

— Por mais que você tenha grande espaço de televisão, mas tenha três, quatro adversários à sua frente com uma base de votos consolidado, você não tem margem de crescimento. Na disputa de São Paulo aconteceu igual, o Márcio França é o que tem mais estrutura e máquina, mas largou muito atrás do Skaf e Dória. Tempo de TV ajuda sim, se analisar é positivo para os candidatos. Já para um candidato pequeno, principalmente majoritário, ele não tem outro caminho, precisa usar a internet como porta de comunicação — afirma Gondo, que analisa o caso de Bolsonaro e Meirelles e diz que não há formula perfeita. — Ele vende imagem do outsider, raramente fala em programa de TV. Os oito segundos que ele tinha servia para pouca coisa, mas agora o atentado o ajudou, ocorreu uma vitimização natural. E quanto menos ele aparece na mídia tradicional, menos chance dele entrar em contradição. Já as peças publicitárias e estratégia do Meirelles são modelos louvados internacionalmente. Mas por que não deslancha? Porque já havia muitos outros candidatos na sua frente. Tempo de TV é importante, mas tem que analisar com calma.

Gaudêncio Torquato, professor de Comunicação Política da USP, também enxerga a polarização como uma particularidade preponderante nessa disputa, o que privilegia o voto emotivo. Para ele, o eleitor, nesse contexto, opta pelo candidato de posicionamentos assertivos, o que prejudica nomes como Alckmin, que conta com muito tempo de televisão, mas não se posiciona de forma contundente. Assim, a mídia entrega visibilidade, mas não poder de convencimento.

Torquato, porém, considera um outro fator nessa campanha que diminui a influência da televisão. Na sua opinião, houve o fortalecimento de novos polos de poder, principalmente entidades intermediárias, como associações, movimentos da sociedade civil e sindicados, assim o candidato precisa se apoiar nessas unidades e fazer agendas nas ruas para crescer.

— Em 2014 os programas eram muito cosmetizados. Agora o eleitor quer saber realmente as propostas e opiniões dos candidatos para temas principais. O marketing político tem cinco eixos: pesquisa, formação do discurso, comunicação, articulação social e mobilização. Nesse ano, os dois últimos se fundiram, porque o eleitor, desconfiado de políticos, não quer se informar só pela televisão, ele quer olho no olho. Movimentos e entidades passaram a influenciar os eleitores. Hoje a campanha está muito ancorada nessa vinculação. Campanha passada dava muito valor a comunicação e marketing, agora vemos menos espetáculo na televisão e mais encontro com massas, sabatinas, palestras. Nessa campanha há mais preocupação na defesa de conteúdo.

IMPACTO É MAIOR EM CAMPANHAS REGIONAIS

Os especialistas, porém, lembram de casos de disputa a governo estadual onde a televisão causou impacto recente. Eugênio Giglio citou, por exemplo, o Rio de Janeiro, em que Eduardo Paes cresceu em média 11 pontos após o início do horário eleitoral gratuito; Minas, com Anastasia; e Pernambuco, com Paulo Câmara, que cresceu com latifúndio de tempo de televisão.

Ele também destacou o poder da mobilização pelas redes sociais.

— No início, a internet era mais para lazer; nessa eleição é diferente, o facebook virou batalha de discurso. Não é a ferramenta em si, mas o tema. Eleição ficou acalorado, eleição de paixão. Bolsonaro conseguiu muita visibilidade na internet, por exemplo — afirmou Giglio.

Torquato concorda e diz que hoje os eleitores estão mais conscientes do que no passado.

— Redes sociais conseguem mobilizar a militância. O PT, por exemplo, marca uma reunião, e aí a rede social consegue fazer comunicação massiva entre militantes, para eles saírem às ruas. Não é tão eficiente em transferir votos, mas mais para consolidar os votos. Nesse momento, o eleitor, mesmo com uma aversão a políticos, está mais consciente que no passado, porque vê a necessidade de mudança da situação.

Na opinião de Roberto Gondo, a internet serve melhor para os candidatos proporcionais, por causa da segmentação de público. Ele também prevê o aumento do uso de aplicativos no futuro.

— Os candidatos a deputado, exceto os puxadores, não precisam da mídia tradicional. Normalmente, eles trabalham em cima de seus nichos, então são ajudados pela internet. No marketing digital, a base é trabalhada em nichos. Se for feito com inteligência, consegue resultado — explica Gondo, que chama a atenção para o cenário a ser formado a partir de 2020, com o fim das coligações. — Redução de partidos vai ser natural. De oito a 10 partidos vão ter condições de se expôr, e aí vamos ver. Acho que vai começar a ter mais uso de aplicativos, que vão se tornar tão fundamentais quanto páginas nas redes sociais. É o caminho natural, o eleitor vai aumentar sua interação com o candidato.

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