Julho das Pretas: Roda de conversa destaca potência de mulheres negras em Camaçari

 Julho das Pretas: Roda de conversa destaca potência de mulheres negras em Camaçari

A potência das mulheres negras invadiu o Horto Florestal de Camaçari nesta quinta-feira (24), com a roda de conversa “Eu te Vejo, Preta”. A atividade compõe a programação do Julho das Pretas, promovido pela Secretaria de Cultura (Secult), tendo como marco o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, celebrado em 25 de julho, data que também marca o Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, no Brasil, desde 2014.

Presente no evento, o prefeito Luiz Caetano reafirmou o compromisso de fomentar ações que reforçam a igualdade racial e o combate à intolerância religiosa. “Em uma sociedade que é racista você tem obrigação de ser antirracista. Poder público e sociedade, temos que estar juntos nessa luta, trabalhar para acabar com tantas mazelas, como a violência religiosa e tantas outras. Sempre falo e defendo que as pessoas, especialmente as mulheres, têm a liberdade de escolher aquilo que elas quiserem ser e seguir”, pontuou.

A secretária de Cultura, Elci Freitas, enalteceu a importância de evidenciar a força das mulheres negras durante todo o ano. “Precisamos continuar nessa luta, que possamos realmente nos reunir no dia a dia para expandir esse sentimento de pertença e resistência por onde passarmos, pois isso é o que nos fortalece”, disse.

Trazendo para a roda temas como ‘Autoestima da mulher negra’ e ‘Empoderamento feminino negro’, a roda de conversa presenteou o público com a potência de três mulheres negras que se destacam em áreas como moda, dança, política e religiosidade. Ângela Cheirosa esteve na lista. Professora, bailarina, produtora cultural e palestrante, a multiartista trouxe uma reflexão sobre os preconceitos e quebra de padrões associados à dança do ventre.

“Se você não racializa tudo, você faz parte do problema. A gente acabou de sair, outro dia, de 300 anos de escravidão, somos recém-chegados em uma abolição que não aboliu de verdade. A dança do ventre é uma arte colonizada, extremamente racista. Não à toa, eu sou a única bailarina negra, no primeiro escalão da dança do ventre, que tem uma turma nacional. Pessoas negras na dança do ventre pagam para dançar, pagam para estar, pagam para bater palma. Ninguém lembrava de mulher negra na dança do ventre, porque não existia essa referência até eu chegar nesse mercado, até eu entender que aquilo ali era pra mim, até eu entender que dança do ventre pode e deve ser acessível aos outros corpos”, avaliou Ângela.

Madá Negrif, empresária e referência em moda afrobrasileira, abordou como a moda poder ser uma poderosa ferramenta de resistência, celebração da identidade e protesto contra a discriminação racial e de gênero, em meio aos desafios recorrentes de representatividade e inclusão na indústria.

“Um dia fui procurar emprego e a pessoa olhou pra mim e disse: ‘com essa roupa, com este cabelo, tem certeza que vai trabalhar aqui?’. A partir daquele momento entendi que precisava fazer algo. Comecei vendendo roupa na sacola e de lá para cá, após conseguir montar meu negócio, são 14 anos. Hoje estou aqui, podendo encorajar meninas a assumirem seus cabelos, suas identidades e entenderem quem elas são. Essa é a minha principal missão. Mostrar também que o corpo fala, como é importante vestir com ancestralidade, respeitando nossas formas”, afirmou.

Jaciara Ribeiro, palestrante, ialorixá e idealizadora do projeto Iyá Akobiode (Mulheres que transformam), falou sobre a luta enquanto ativista contra a intolerância religiosa. “A gente ainda tem que pedir licença para entrar no ônibus, no shopping e até utilizar serviços básicos de saúde. Nossa luta não é só para ter direito de entrar onde quisermos com nossas roupas, é pelo direito de viver”, destacou.

A mobilização e visibilidade das pautas foi celebrada pelo público presente. “Nós, enquanto mulheres pretas, temos que apoiar a comunidade, a cidade onde a gente vive e mostrar sempre que nós somos guerreiras. Prestigiar eventos como esse é dizer para a sociedade que a causa existe e precisa ser debatida para que as futuras gerações cresçam com essa consciência de igualdade e unidade. Me senti representada em cada uma das palestrantes, a conquista delas é minha também e afirma que todas nós temos capacidade de vencer um dia”, apreciou Andrea Alves de Santana, 51 anos, moradora de Jauá.

Além de autoridades municipais e de representantes da sociedade civil, fizeram parte do evento estudantes do Centro Educacional Tancredo Neves, localizado em Jauá.

Criado em 2013 pelo Odara – Instituto da Mulher Negra, organização negra centrada no legado africano e sediada em Salvador, o Julho das Pretas é considerada a maior agenda conjunta e propositiva de incidência política de organizações e movimento de mulheres negras do Brasil. Em Camaçari, as atividades começaram no dia 15, passando por equipamentos culturais de Parafuso, Vila de Abrantes, Barra do Pojuca e pela Pracinha da Cultura, no Phoc III.

“Hoje, consegui ver todas as mulheres pretas como eu sempre me enxerguei. Nessa perspectiva, entendendo a importância do Julho das Pretas e o fortalecimento cultural na potencialização da vida de mulheres negras, plantamos um fruto lindo ao longo dos encontros que percorremos. É a cultura de Camaçari traçando novos caminhos e pintando novas cores”, pontuou a coordenadora do Núcleo Étnico-Racial da Secult, Lais Cataryne, ao enfatizar a relevância do projeto.

Conferência Municipal

Integrando as comemorações do Julho Pretas, na segunda-feira (28) a Secretaria de Desenvolvimento Social e Cidadania (Sedes) realiza a 4ª Conferência Municipal da Mulher Negra de Camaçari, no Horto Florestal. Na oportunidade, serão debatidas e propostas diretrizes para as políticas públicas voltadas às mulheres negras que vivem na cidade.

Foto: Patrick Abreu

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