Por que os consumidores baianos quase nunca pagam 10% para os garçons?

Eternizada pelo rei do brega Reginaldo Rossi, a figura do garçom, além de indispensável para o funcionamento de restaurantes, bares e similares, tornou-se um símbolo da vida noturna. Tanto quanto importante, fomenta-se uma polêmica acerca desta classe: a taxa de 10% cobrada sobre os serviços prestados nestes estabelecimentos.

A discussão sobre o assunto costuma ser acalorada. De um lado, empresas posicionam-se a favor da cobrança da taxa, do outro, muitos consumidores a criticam. Em agosto do ano passado, a então presidente Dilma Rousseff (PT) vetou integralmente o Projeto de Lei aprovado pelo Congresso Nacional que tornava obrigatório o pagamento de 10% de gorjeta embutida como taxa de serviço. Apesar disso, a cobrança do valor é, de acordo com alegações de clientes, realizada de modo impositivo, o que faz com que o pagamento adicional pelo serviço prestado seja compulsório. Na pauta das discussões está, também, o fato de que os clientes afirmam não saber se o valor pago é devidamente repassado para o empregado.

O momento da cobrança dos 10% costuma ser acompanhado por tensão pelos clientes que pretendem não pagar o acréscimo sobre o valor total da conta. O próprio garçom que faz o atendimento é responsável por levar à mesa o recibo do valor total, acrescido da taxa. Assim, o cliente pode se sentir constrangido em dizer que não pretende pagar o valor, já que se supõe que este seria integrado ao salário dos empregados. Além disso, muitas vezes, o grupo de amigos que se reúne num bar, por exemplo, não quer pagar o valor por questões financeiras e por conta dá má qualidade da prestação do serviço. Muitos baianos acumulam histórias sobre o constrangimento pelo qual já passaram nestas situação.

A administradora Júlia Oliveira relembra uma situação constrangedora no Rio Vermelho. ‘’Eu fui numa pizzaria com uns amigos e não queríamos pagar os 10%. Aí o garçom veio perguntar para a gente o porquê de não termos pago, se ele tinha feito algo de errado e que o salário dele dependia daquilo. Eu acho que por isso é uma prática mal exercida. Penso que, principalmente, por parte dos patrões, pois eles atrelam muito o rendimento dos funcionários com o recebimento dos 10%, o que não deveria ser feito”, diz ela.

PÃO DURO

Foto: Onde Comer em Salvador

Para Edinho Engel, chefe e proprietário do Restaurante Amado, em Salvador, o baiano tem um ‘’escorpião’’ no bolso.

Ainda segundo o empresário, o cliente não pagar os 10% porque ficou insatisfeito com o serviço prestado é um paradoxo. ‘’Vira uma questão assim: a gente não tem um serviço bom porque não paga a caixinha ou não tem um serviço bom porque não paga a caixinha? É como perguntar quem que nasceu primeiro: O ovo ou a galinha?’’, completa.

‘’Eu acho que quando um profissional recebe esses 10%, ele se sente reconhecido. Ao passo que, quando ele não recebe, ele se pergunta o porquê. O cliente deveria usar os 10% pois incentiva o garçom a prestar um serviço melhor. Quando o cliente faz isso incentiva o cara a trabalhar mais’’, diz Edinho.

Para ele, o não pagamento da taxa é, na verdade, motivada não pelo insucesso do serviço prestado. “Acho que muita gente não paga porque é pão dura’’, finaliza.

OS 10% NA BAHIA NÃO É OBRIGATÓRIO

Foto: Reprodução

”A cobrança dos 10% não é obrigatória, nunca foi”, aponta o Ramos, presidente do Sindicato dos Empregados em Hotéis Bares e Similares. De acordo com ele, que foi garçom durante cerca de dez anos, o sindicato reconhece que muitas empresas parecem obrigar o pagamento, mas que nenhum cliente é obrigado a dar. ”Quem dá o salário do empregado é o empresariado, a gorjeta é consequência do bom serviço”, diz.

Para ele, o que acontece, na prática, é que muitos empresários têm feito dos 10% o salário do trabalhador. ”Hoje, na situação em que o trabalhador está, ele aceita tudo, não pensa nas consequências no futuro dele. Aí os aproveitadores da vida vão e fazem isso”, indica.

Ramos sinaliza, ainda, que uma das questões relacionadas aos 10%, também apontada por muitos clientes, é o repasse da taxa. ”Todo os 10% tem que ser repassado para o trabalhador, até mesmo para garantir os direitos sociais. Não pode ser distribuído aleatoriamente, ao belo modo do empresário. A maioria das empresas repassa como quer e entende para o trabalhador. Existem muitas denúncias do trabalhador em relação a isso”, finaliza o presidente do Sindicato.

Quanto a sensação de constrangimento que muitos clientes alegam sentir ao receberem a pergunta ”inclui os 10%?”, Ramos diz que ‘ninguém é obrigado a nada”.

”Se eu vou num determinado ambiente, e o garçom vier me interpelar se eu não vou dar a gorjeta, eu tenho que chamar o gerente, o dono da casa, para resolver isso”, conclui. A advogada Viviane Pitanga salienta que em caso de constrangimento, o consumidor poderá se dirigir ao Procon para registrar sua reclamação ou recorrer aos Juizados Especiais. (Aratuonline)

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