Saiba o que ocorre após Temer ser denunciado por corrupção passiva

 Saiba o que ocorre após Temer ser denunciado por corrupção passiva

Com a denúncia contra o presidente Michel Temer apresentada por Rodrigo Janot, cabe agora à Câmara dos Deputados autorizar ou não a abertura do processo. Após receber a denúncia, a Casa deve notificar o acusado e encaminhá-la para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde Temer terá um prazo de dez dias úteis para se defender.
Em seguida, a CCJ tem mais cinco sessões para emitir um parecer em que diz se é contra ou a favor do pedido de abertura de uma ação penal. Isso não impede que a ação seja analisada pelo plenário, onde uma votação nominal exige o apoio de 2/3 dos deputados para que a denúncia seja admitida e o STF instaure um processo contra o presidente. Se a denúncia for aceita no STF, o presidente se torna réu e fica afastado. Se o julgamento não for concluído em até 180 dias, ele volta ao cargo.
Rodrigo Janot denuncia Temer por corrupção passiva
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou criminalmente o presidente Michel Temer (PMDB) por corrupção passiva no caso JBS. Temer torna-se, assim, o primeiro presidente a responder por crime comum no exercício do mandato.
Rodrigo Rocha Loures (PMDB), ex-assessor especial do presidente, também foi denunciado pelo mesmo crime.
A denúncia foi protocolada ontem, no Supremo Tribunal Federal (STF). Janot, que tinha até hoje para apresentar a denúncia, atribui crime a Temer a partir do inquérito da Operação Patmos – investigação desencadeada com base nas delações dos executivos do grupo J&F, que controla a JBS.
A ação proposta por Janot não pode ser aberta diretamente pelo Supremo. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte máxima, terá de enviar a acusação formal do procurador à Câmara – Casa que pode autorizar a abertura do processo contra o presidente. Para isso, é necessária a aprovação de dois terços dos 513 deputados.

Denúncia contra Michel Temer foi feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e depende da Câmara para virar processo (Foto: AFP)

Gravação
Na noite de 7 de março, Temer recebeu no Palácio do Jaburu o executivo Joesley Batista, que gravou a conversa com o peemedebista. Nela, Joesley admite uma sucessão de crimes, como o pagamento de mesada de R$ 50 mil ao procurador da República Ângelo Goulart em troca de informações privilegiadas da Operação Greenfield, investigação sobre rombo bilionário nos maiores fundos de pensão do país.
A investigação também revela os movimentos de Loures. Na noite de 28 de abril, ele foi flagrado em São Paulo correndo com uma mala de propinas da JBS – 10 mil notas de R$ 50, somando R$ 500 mil. Os investigadores suspeitam que a propina seria destinada a Temer, o que é negado pela defesa do presidente.
Janot pede multa de R$ 10 milhões ao presidente a título de danos morais coletivos. Ao ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures, Janot pediu penalidade de R$ 2 milhões.
Novo inquérito
Na denúncia que enviou ontem ao STF, Rodrigo Janot pede que seja aberto um novo inquérito contra Temer e Rocha Loures, para investigar os fatos relativos ao Decreto dos Portos, sob a suspeita de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e corrupção passiva. É o fatiamento da denúncia temido pelo Planalto.
Janot solicita o depoimento de Antônio Celso Grecco, dono da empresa Rodimar; João Batista Lima Filho, coronel aposentado e amigo de Temer; e José Yunes, ex-assessor especial da Presidência de Temer.
Defesa
O advogado Antonio Mariz de Oliveira, que defende o presidente, disse que irá se manifestar “mais profundamente” quando tiver acesso à denúncia. “Mas posso desde logo afirmar a minha absoluta certeza de que a denúncia não está calcada em fatos concretos e comprovados, uma vez que o presidente da República não cometeu nenhuma conduta que pudesse ser enquadrada no tipo penal da corrupção passiva”, afirmou ele.
“Assim que examinar a acusação, eu estarei pronto a manifestar-me, não só como advogado do presidente, mas como advogado que sabe distinguir acusação fundada de acusação desarrazoada.”
Relatório da PF
Além da denúncia de Janot, a Polícia Federal concluiu que o presidente cometeu o crime de obstrução de investigação de organização criminosa, em relatório encaminhado ontem, também ao STF. O crime está previsto na Lei das Organizações Criminosas, de 2013. A pena é de reclusão de 3 a 8 anos e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas.
No relatório, a PF também vê a mesma conduta criminosa do ex-ministro do governo Temer Geddel Vieira Lima e do empresário e delator Joesley Batista.
A atribuição de conduta criminosa a Temer se dá, na visão da PF, “por embaraçar investigação de infração penal praticada por organização criminosa, na medida em que incentivou a manutenção de pagamentos ilegítimos ao (deputado cassado) Eduardo Cunha, pelo empresário Joesley Batista, ao tempo em que deixou de comunicar autoridades competentes de suposta corrupção de membros da Magistratura Federal e do Ministério Público Federal que lhe fora narrada pela mesmo empresário”. Cunha está preso no Paraná desde outubro do ano passado.
Essa é a conclusão encaminhada ao Supremo no relatório final do inquérito que investiga Temer e Rodrigo Rocha Loures. O Supremo, por meio do ministro Edson Fachin, já encaminhou à PGR o relatório para que a Procuradoria possa decidir se denuncia ou arquiva o caso.
A conclusão da PF é baseada no diálogo entre Temer e Joesley, em que, diante da afirmação de Joesley que estava cuidando de Cunha, Temer teria concordado com isso, de acordo com os investigadores. “Tem que manter isso, viu?”, disse Temer ao empresário, que respondeu: “Todo mês”.
Geddel também foi apontado como tendo praticado o crime de obstrução à investigação porque “manifestou interesse na manutenção de pagamentos a (Lúcio) Funaro (operador financeiro ligado a Cunha)”, segundo a PF.
Quanto a Joesley, a PF afirmou que ele agiu de forma a “embaraçar investigação de infração penal que envolva organização criminosa ao manter pagamentos ilegítimos a Cunha e a Funaro, enquanto presos, a pretexto de mantê-los em silêncio ou de não se ver envolvido em eventuais revelações de fatos comprometedores a si próprio e ao grupo empresarial que comandava”.
Em relação à participação em organização criminosa, a PF recomendou que os fatos sejam incluídos nos autos de um inquérito que já existe no STF para apurar a suposta organização criminosa composta por membros do PMDB na Câmara.
‘Nada nos destruirá’, afirma presidente
O presidente Michel Temer afirmou ontem, antes da denúncia de Janot, que seu governo está “na rota da superação e nada o destruirá”. “Nossa agenda de modernização do Brasil é a mais ambiciosa de muito tempo. Não há plano B. Há de seguir adiante. Nada nos destruirá. Nem a mim, nem aos nossos ministros”, afirmou ele, no Palácio do Planalto.
A uma plateia de empresários e comerciantes, o presidente ainda disse que “o Brasil está nos trilhos, na rota da superação” e que a agenda tem sido implementada “com disciplina, tenacidade, com sentido de missão”.
Temer tentou destacar um discurso otimista de retomada da economia, principalmente no varejo, durante a sanção de proposta que autoriza a diferenciação de pagamentos de bens e serviços oferecidos conforme o meio de pagamento, ou seja, regulamenta os descontos em compras à vista ou pagas com dinheiro em espécie.
Temer disse ainda que sabe que seu governo é transitório e que está fazendo uma transição para quem vem depois “encontrar o país nos trilhos do crescimento”: “Ninguém duvide da nossa agenda de modernidade”, disse ele.
O presidente não citou a derrota da reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), na semana passada, e destacou que a modernização trabalhista vai gerar mais emprego e não retira direitos. “Resgatamos a responsabilidade fiscal como pilar da nossa economia”, afirmou, lembrando a PEC que implementou um limite do teto dos gastos públicos.
O presidente lembrou que grande parte do povo não tem cartão de crédito, mas que ela (a responsabilidade fiscal) promove “a transparência na economia”.
Temer citou ainda que tem tido, ao longo de seu governo, “a satisfação” de estar atendendo demandas e produzindo pelo país, se referindo aos descontos em compras à vista ou pagas com dinheiro em espécie. “Nem todos entendem bem isso, às vezes, as pessoas tomam outros caminhos, mas vamos continuar produzindo pelo país, realizar e fazer”, falou Temer.
Temer ressaltou a liberação do FGTS e disse que a medida impulsionou o varejo. Afirmou ainda que, com a diferenciação de preço, os lojistas e varejistas terão mais chances de eventualmente reclamar com operadoras de cartão. “A MP de hoje é só mais um passo num caminho de um Brasil mais moderno.”
Após cerimônia de recebimento de cartas diplomáticas, Temer não respondeu às perguntas dos jornalistas sobre se iria seguir o conselho dado por Fernando Henrique Cardoso, em artigo publicado ontem no jornal Folha de S.Paulo, e encurtar o mandato. Ele se virou para a imprensa e apenas sorriu.
Líderes da base veem risco; oposição diz que vai obstruir votações
Líderes da base aliada de Michel Temer na Câmara dos Deputados afirmaram não ser possível assegurar a rejeição da denúncia apresentada pelo procurador-geral Rodrigo Janot. Mesmo com uma coalizão estimada em cerca de 400 deputados, parlamentares ponderam que o teor da acusação formal e os seus desdobramentos podem influenciar o posicionamento dos congressistas.
Para Baleia Rossi (SP), líder do PMDB, partido de Temer e que tem a maior bancada da Casa, com 64 deputados, o governo não pode se descuidar. “Cada líder da base vai ter que trabalhar sua bancada. Não dá para achar que está tudo resolvido”, disse.
Já líderes do PT na Câmara e no Senado classificaram como “gravíssima” a denúncia feita por Janot e prometem obstruir votações na Câmara.
“Não vamos aceitar qualquer manobra que o governo tente fazer”, afirmou o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), líder da bancada petista. Segundo ele, mesmo que Temer consiga maioria na CCJ da Câmara para barrar a denúncia, ele não atingirá os 172 votos necessários no plenário. O líder da minoria na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse não haver mais clima no Congresso para discutir as reformas trabalhista e da Previdência, apostas do governo para sair da crise.

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