Durante as audiências realizadas nas últimas duas semanas no Supremo Tribunal Federal (STF), testemunhas confirmaram a acusação de que o ex-presidente Jair Bolsonaro articulou um plano para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva após as eleições de 2022. Os depoimentos encerraram-se nesta segunda-feira (2), e Bolsonaro será ouvido na próxima semana, junto a outros sete réus.
O ex-presidente é julgado por supostamente liderar uma organização criminosa com o objetivo de se manter no poder de forma ilegal. Caso condenado, pode pegar até 40 anos de prisão. As audiências reuniram cerca de 50 testemunhas, entre elas ex-ministros, policiais e oficiais militares de alta patente.
Dois ex-comandantes das Forças Armadas — Marco Antônio Freire Gomes (Exército) e Carlos de Almeida Baptista Júnior (Aeronáutica) — confirmaram que Bolsonaro discutiu medidas como “estado de defesa” e “estado de sítio” para anular o resultado eleitoral. “Alertei ao presidente que ele poderia ser implicado juridicamente por isso”, afirmou Freire. Já Baptista Júnior disse ter deixado claro: “Aconteça o que acontecer, no dia 1º o senhor não será presidente”.
Em contrapartida, o almirante Almir Garnier Santos, então comandante da Marinha, teria se colocado à disposição de Bolsonaro, segundo Baptista. Garnier é também réu no processo.
A defesa do ex-presidente apresentou o atual governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, como testemunha. Aliado de Bolsonaro, Tarcísio afirmou que nunca presenciou ou ouviu qualquer menção a um plano golpista e descreveu o ex-presidente como “triste e resignado” após a derrota nas urnas.
Os depoimentos também abordaram os ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. O então vice-diretor da Abin, Saulo Moura da Cunha, relatou ter emitido alertas às forças federais sobre os riscos de invasão. Já o general Júlio César de Arruda, que assumiu o Exército após Freire, justificou a demora na repressão dizendo ter buscado uma ação “coordenada” diante de um “clima de nervosismo”.
Segundo o professor Thiago Bottino, da Fundação Getúlio Vargas, os depoimentos representam um momento decisivo na história democrática do país. “Comandantes indicados por Bolsonaro recusaram participar de um golpe. Isso é um ponto de inflexão para um país com nosso histórico”, avaliou.
O julgamento seguirá na próxima semana com os interrogatórios dos réus, e o veredicto deverá ser conhecido nos próximos meses.