A Chapecoense e o poder transformador do futebol

Por Fabiano Tatu

Futebol é uma praga! Quantas vezes já não me peguei amaldiçoando o dia em que sucumbi a esse negócio? O problema é que ver jogo nem é a parte mais viciante pra mim, embora eu veja uma infinidade deles toda semana. O que de fato me encanta no futebol são as histórias que ele ajuda a construir. A abdução se dá no momento em que a gente entende que a graça maior está nisso.

É desse jeito que acompanho futebol desde sempre. Ele é essencial pra mim e ocupa um espaço muito significante na minha vida. Mesmo assim, foi preciso uma tragédia acontecer pra eu me dar conta do quanto tudo e todos que fazem parte dele me são importantes. Eram vozes e rostos que entravam na minha casa praticamente todos os dias, e olha que eu nem sou torcedor da Chape. Então eu penso nos que conviviam com eles, dividiam planos e sonhos, vibravam junto, ou ficavam putos e xingavam os caras nos jogos, como eu xinguei várias vezes os que passaram pelo Flamengo, ou quando jogavam contra ele. Não tem como não sentir falta. E pode ter certeza de que vão fazer muita falta.

Agora, sempre que a Chapecoense entrar em campo vamos nos lembrar das histórias de vida encerradas por aquele acidente, dos sonhos interrompidos, dos pais que perderam seus filhos, dos filhos que perderam seus pais, das esposas que não terão mais seus maridos pra abraçar, dos ídolos que não vão mais ser aclamados e das amizades de uma vida toda, que tão brutalmente foram despedaçadas.

Um exemplo raro de gestão responsável e eficaz no futebol brasileiro — que deveria ser seguido inclusive por vários dos grandes do país — transformou a vida de toda uma cidade, elevou seu astral, sua auto-estima, pôs um sorriso largo e cheio de orgulho no rosto dos seus mais de 200 mil moradores, provando outra vez que o futebol é transformador. A gente olhava pra eles com admiração, como quem olha pra um jovem brilhante, cheio de vida e de projetos e alguém que acredita que o sucesso deve mesmo vir pelo trabalho bem feito e a força pra aguentar as porradas que certamente vai tomar pelo caminho.

De alguma forma a gente se via representado pela Chape. Porque a maioria de nós é meio que uma Chapecoense na vida. Nós também somos o time pequeno que luta pra se manter vivo em meio aos gigantes, também sonhamos conquistar coisas importantes e escrever nossos nomes na história. Talvez seja por isso que a tragédia nos pareça tão próxima.

E como é que clube e torcida podem superar a perda de um time inteiro? Eles vão precisar de muita força. Mas vão conseguir. A Chape vai se reconstruir e ficar ainda maior e mais forte. E vai ser lindo acompanhar. Quanto a nós, além de dar a eles todo apoio que merecem, em respeito ao clube, aos seus jogadores, dirigentes e membros da comissão técnica, aos jornalistas e demais profissionais de futebol que estavam a bordo daquele avião, temos que sair dessa de um jeito melhor do que entramos, pois não se pode levar uma pancada tão violenta assim e não tirar qualquer lição dela. E a mais importante talvez seja aprender que não é preciso passar por traumas tão profundos pra se ter mais empatia, compaixão, respeito e carinho uns pelos outros. Exercer esses valores no nosso dia a dia é a grande homenagem que podemos prestar àqueles que com sua morte provaram que o futebol está mesmo bem longe de ser só um jogo e mostraram que a humanidade ainda tem jeito, sim.

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