8 homens têm riqueza igual à metade mais pobre do mundo

A fortuna das oito pessoas mais ricas do mundo é igual ao patrimônio da metade mais pobre da população mundial, o equivalente a 3,6 bilhões de pessoas. Sim, você entendeu certo. Desde 2015, o 1% mais rico detém mais dinheiro que o resto do planeta somado. Os números são da Oxfam, confederação de ONGs presente em 94 países, incluindo o Brasil, que trabalha para a redução da desigualdade. O relatório, intitulado “Uma economia para os 99%”, será apresentado no Fórum Econômico Mundial, em Davos, que ocorre nesta semana.

Segundo a Oxfam, a desigualdade vem crescendo a cada edição do estudo, a uma velocidade ainda maior do que a prevista. No ano passado, o relatório indicava que as 62 pessoas mais ricas possuíam riqueza equivalente à metade mais pobre da população. No início da década, eram 388 indivíduos com a mesma proporção da riqueza de 3,5 bilhões de pessoas.

Atualmente, os 50% mais pobres do mundo detêm menos de 0,25% da riqueza global líquida. Desse grupo, de 3,6 bilhões de pessoas, cerca de 3 bilhões vivem abaixo da “linha ética de pobreza” — definida pela riqueza que permitiria que as pessoas tivessem uma expectativa de vida normal de pouco mais de 70 anos.

Para ilustrar o tamanho do abismo entre os mais ricos e os mais pobres do mundo, a Oxfam fez mais algumas comparações. Segundo o levantamento, um diretor executivo de qualquer empresa do índice FTSE-100 (da bolsa de valores de Londres) ganha o mesmo em um ano que 10.000 pessoas que trabalham em fábricas de vestuário em Bangladesh. E, no Vietnã, o homem mais rico do país ganha mais em um dia do que a pessoa mais pobre ganha em dez anos.

A confederação alerta, ainda, que a diferença entre mais ricos e mais pobres tem aumentado. De acordo com uma pesquisa recente, realizada pelo economista Thomas Piketty, nos últimos 30 anos, a renda dos 50% mais pobres nos Estados Unidos permaneceu inalterada, enquanto a do 1% mais rico aumentou 300%. “Se nada for feito para combatê-la, a desigualdade crescente pode desintegrar nossas sociedades. Ela aumenta a criminalidade e a insegurança e mina o combate à pobreza. Ela gera mais pessoas vivendo com medo do que com esperança”, diz o estudo.

“O relatório detalha como os grandes negócios e os indivíduos que mais detêm a riqueza mundial estão se alimentando da crise econômica, pagando menos impostos, reduzindo salários e usando seu poder para influenciar a política em seus países”, afirmou Katia Maia, diretora executiva da Oxfam no Brasil, em nota.

A Oxfam ressalta que acontecimentos recentes no mundo, como o Brexit, a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, o aumento do racismo e da desilusão com a política tradicional, indicam que um número crescente de pessoas nos países ricos não está mais disposto a tolerar o status quo. “O desafio é o de construir uma alternativa positiva — e não um modelo que acentua as divisões”, conclui o relatório.

Para os países pobres, a situação tem melhorado, mas ainda está longe de ser resolvida. Centenas de milhões de pessoas foram retiradas da pobreza nas últimas décadas. Mesmo assim, uma em cada nove ainda passa fome, ressalta o relatório. Segundo pesquisas recentes, três quartos da extrema pobreza poderiam ser efetivamente eliminados imediatamente usando recursos já disponíveis, aumentando a tributação e reduzindo gastos militares e outras despesas regressivas.

As causas

O documento elenca o que considera ser as causas de tamanha desigualdade no mundo. O primeiro item citado é o fato de as empresas trabalharem para os ricos. Apesar de reconhecer que as companhias “constituem a força vital de uma economia de mercado e, quando trabalham em benefício de todos, desempenham papel vital na construção de sociedades justas e prósperas”, a Oxfam aponta que atualmente elas estão acentuando a desigualdade. “Nesse processo, os benefícios do crescimento econômico são negados aos que mais precisam deles.”

Isso acontece porque, nos esforços para entregar rendimentos elevados aos mais ricos, as empresas pressionam os trabalhadores e fornecedores. Assim, enquanto os salários dos altos executivos continuam crescendo, os salários de trabalhadores comuns e a receita de fornecedores têm permanecido praticamente inalterados e, e em alguns casos, até diminuído.

Piora a situação o fato de que mudanças na estrutura do mercado de trabalho levaram à perda do poder de barganha dos trabalhadores em negociações coletivas. Segundo o relatório, o diretor executivo da maior empresa de informática da Índia ganha 416 vezes mais que um funcionário médio da mesma empresa. Outro exemplo para ilustrar a pressão sobre a remuneração dos fornecedores: na década de 1980, produtores de cacau ficavam com 18% do valor de uma barra de chocolate — atualmente, ficam com apenas 6%.

Além disso, para melhorar a rentabilidade, as empresas muitas vezes evitam pagar impostos, que beneficiariam a todos, especialmente aos mais pobres. “Elas usam paraísos fiscais ou fazem com que os países concorram uns com os outros na oferta de incentivos e isenções fiscais e de alíquotas tributárias mais baixas”.

Dentro das empresas, a Oxfam vê mais uma causa para o agravamento da desigualdade: o empenho em remunerar os acionistas rapidamente. “Cada dólar de lucro passado aos acionistas de empresas é um dólar que poderia ter sido usado para garantir uma remuneração mais alta a produtores ou trabalhadores, pagar mais impostos ou investir em infraestrutura ou inovação”, defende a organização. O lobby ainda tem papel importante nesse cenário, no qual as empresas pressionam governos por redução de impostos e maiores vantagens.

Outro fator que aumenta a desigualdade é a forma como os super-ricos continuam vendo suas fortunas aumentarem. “Os super-ricos têm dinheiro para gastar com as melhores orientações de investimento e a riqueza detida por eles desde 2009 vem crescendo a uma taxa média de 11% por ano”, aponta o relatório.

Ainda nessa linha, a Oxfam afirma que os ricos se beneficiam da evasão fiscal para manter suas forturas. “Muitos dos super-ricos também usam seu poder, influência e relações para influenciar círculos políticos e garantir que as regras os favoreçam. Os bilionários do Brasil fazem lobby para reduzir impostos e, em São Paulo, eles preferem ir de helicóptero para o trabalho, evitando os engarrafamentos e problemas infraestruturais enfrentados nas ruas e avenidas da cidade”.

As mulheres ainda são as mais prejudicadas

O relatório ressalta que há uma grande diferença de gênero que se soma ao abismo de riqueza entre os mais ricos e os mais pobres. As mulheres tendem a se concentrar na metade inferior da distribuição de renda. No mundo, a chance de mulheres participarem do mercado de trabalho remunerado é cerca de 27 pontos porcentuais menor do que a dos homens, em média.

Mais: em empregos formais, é comum que as mulheres recebam salários menores do que os homens. As mulheres ganham de 31% a 75% menos do que os homens devido à lacuna de remuneração e a outras desigualdades econômicas, como a falta de acesso a proteção social, que se acumulam e as deixam em situações bem piores ao longo da vida.

Mesmo em economias avançadas, onde a disparidade de escolaridade de gêneros já foi, em grande parte, eliminada, os homens continuam a ser maioria entre o grupo de alta renda. Na Dinamarca, em 2013, as mulheres representavam apenas 31% do grupo dos 10% com renda mais alta. No mesmo ano, no Canadá, esse porcentual era de 30%; na Nova Zelândia, de 29%; e no Reino Unido, de 28%. Na Itália, em 2014, as mulheres eram 29% do grupo.

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