Mesmo com avanço do vírus, isolamento social cai na Bahia

 Mesmo com avanço do vírus, isolamento social cai na Bahia

Enquanto tem crescido o número de infectados pelo coronavírus, a adesão ao isolamento social caiu na Bahia e ficou abaixo da média nacional, segundo pesquisa realizada entre os dias 27 e 29 de abril pelo DataPoder360. O levantamento, que está em sua segunda rodada, é uma parceria do Grupo A TARDE com o jornal digital Poder360, com o patrocínio da Associação Comercial da Bahia (ACB).

O índice de baianos que disseram sair de casa para trabalhar subiu de 27% para 37% em duas semanas, enquanto a média brasileira passou de 32% para 31%, de acordo com a pesquisa. Em Salvador, os números de adesão ao isolamento também pioraram, subindo de 27% para 33% os entrevistados que afirmaram ter saído para trabalhar.

“Acredito que seja uma combinação de fatores econômicos, pessoas precisando trabalhar para tentar pagar as contas, e possivelmente a retórica confusa e ambígua sobre a quarentena vinda do governo federal. E acredito que também um pouco de fatores psicológicos, de as pessoas simplesmente quererem sair de casa”, avalia Rodolfo Costa Pinto, cientista político do DataPoder360, divisão de estudos estatísticos do Poder360. Além do fator econômico, o cientista político acredita que, como na Bahia a situação é até então menos pior do que em outros estados, “as pessoas podem achar que é menos arriscado sair de casa”.

Nessa segunda rodada da pesquisa, uma nova pergunta foi adicionada, para saber a quantidade de vezes que as pessoas saem de casa, sem contar idas ao trabalho. No Brasil e em Salvador, 64% dos entrevistados disseram que saem de uma a três vezes por semana e 18% de quatro a cinco vezes. Na Bahia, os índices são de 56% e 25%, respectivamente. Portanto, em todos os cenários examinados, há percentuais superiores a 80% para quem tem saído pelo menos uma vez por semana de casa.

“Isso mostra que a quarentena não está sendo seguida tão à risca quanto se deveria. Há número relevante de pessoas saindo de casa durante a semana. Isso pode ter reflexos lá na frente em relação ao número de infectados”, destaca o cientista político.

Economia

Um número que dá uma dimensão do impacto econômico da atual crise é a quantidade de pessoas que disseram ter deixado alguma conta em aberto no último mês – foram 73% dos entrevistados no estado e 68% na capital. “Setenta e três por cento dos entrevistados dizendo que deixaram de pagar alguma conta no último mês é um número extremamente importante e mostra o impacto econômico da crise atual. É consequência de 75% das pessoas terem dito que a crise do coronavírus afetou sua fonte de renda. Esse número da Bahia inclusive é maior que a média nacional, de 67%”, afirma Costa Pinto.

No grupo dos baianos desempregados ou sem renda fixa, 86% responderam que já deixaram de pagar alguma conta. Entre os que ganham até dois salários mínimos, 66% já têm algum boleto vencido.

Integrante do grupo que teve sua fonte de renda prejudicada, o autônomo Fredson Farias, 36 anos, já tem contas de água e luz vencidas. Morador de Itapuã, ele relata que passou cerca de nove horas em uma fila da Caixa Econômica Federal. na última quinta-feira (30), para o saque do auxílio emergencial. “Para os mais pobres, ficar em casa é muito difícil. Assim como eu, existem pessoas que vivem do trabalho na rua, nem têm uma renda tão fixa e planejada. É por isso que enfrentamos filas e mais filas. Ninguém está aqui por querer, mas por precisão”, disse ao A TARDE, enquanto aguardava ser atendido.

Antes da quarentena, Fredson atuava como técnico de refrigeração. “Estava fazendo o que aparecia no dia. Como ninguém recebe mais visita, nem tem como trabalhar de autônomo”, afirma. A renda da casa, que era de um salário mínimo e meio, caiu pela metade, segundo ele.

Em relação às medidas de distanciamento, Fredson afirma que tem saído de casa duas vezes por semana, em média, na maioria das vezes para comprar produtos essenciais, como remédio ou comida. “A gente toma cuidado de tentar se proteger em casa. Porém, acaba correndo o risco de adoecer pelo vírus nesta fila. E fica um grudado no outro, não tem limite de distância”, reclamou.

Auxílio

Sobre o auxílio de R$ 600 pago pelo governo federal, o alcance tem sido o mesmo para habitantes da Região Metropolitana de Salvador (RMS) e outras regiões do estado, conforme a pesquisa.

O percentual daqueles que dizem ter recebido o benefício é igual (17%), assim como de quem afirmou que teve o cadastro recusado (11%). NA RMS, porém é maior o índice dos que afirmaram não ter direito ao auxílio (34%), em comparação com outras áreas da Bahia (19%).

Ainda com base no levantamento, o pagamento do auxílio pode ter melhorado um pouco a situação das camadas mais pobres. No recorte por renda no estado, entre os desempregados ou que não têm renda fixa, 82% disseram que a fonte de renda foi prejudicada (eram 86% na primeira rodada). Entre os que ganham até dois salários mínimos, esse número passou de 76% para 70%.

Já entre os que ganham de dois a cinco salários mínimos, o índice era de 61% e subiu para 69%. Para aqueles que recebem entre cinco e dez salários, o número passou de 41% para 58%. “Quem ganha até dois salários provavelmente foi beneficiado de maneira mais rápida com os R$ 600 do governo federal. Já para quem ganha mais, é possível que agora esteja compreendendo melhor o tamanho e duração da crise”, opina Costa Pinto.

Ainda no recorte por renda na Bahia, o grupo que ganha entre dois e cinco salários mínimos é o único no qual a maioria diz que saiu para trabalhar (55% contra 45%). Para o cientista político, essa é a faixa na qual há mais pessoas com trabalho essencial. “Abaixo disso tendem a ser pessoas no mercado informal, ou desempregadas, e que dependem de ajuda do governo. Acima dessa faixa de renda, os profissionais tendem a ser de colarinho branco e com capacidade de trabalhar de casa”, diz.

Otimismo

Antes abaixo da média nacional, o nível de otimismo dos baianos se equiparou ao dos brasileiros, conforme a pesquisa. “O número de 15 dias atrás estava mais baixo que o normal para as pesquisas que sempre fazemos. Provavelmente tivemos uma variação amostral, que nessa rodada voltou ao normal”, pontua Costa Pinto.

No estado, os entrevistados que disseram achar que a vida vai melhorar passaram de 34% para 44% – o índice nacional permaneceu em 42%. Ainda na Bahia, aqueles que acreditam que a vida vai continuar igual oscilaram de 21% para 19% e os que afirmaram que vai piorar passaram de 17% para 13%.

Em Salvador, 38% disseram que a vida vai melhorar – antes eram 35%. Outros 19% afirmaram que vai se manter igual e 21% opinaram que vai piorar.

Percepção de risco sobre o vírus é maior

Apesar da queda verificada na adesão ao isolamento social, aumentou no estado o percentual daqueles que acreditam que a prática deve ser adotada por todos, independentemente da faixa etária.

“Por um lado, aumenta a pressão econômica para as pessoas voltarem a trabalhar e ter alguma renda e, por outro, existe um aumento da percepção de risco sobre o vírus, o que faz as pessoas terem mais consciência sobre as consequências da Covid-19”, defende o cientista político Rodolfo Costa Pinto.

Na primeira rodada da pesquisa realizada pelo DataPoder360, há duas semanas, 49% dos entrevistados baianos disseram que todos deveriam continuar em casa e 40% opinaram que os mais jovens poderiam voltar ao trabalho, com o uso de máscaras.

O resultado mais recente aponta que 56% dos baianos preferem o isolamento social amplo, ao contrário do que defende, por exemplo, o presidente Jair Bolsonaro.

O levantamento também identificou movimentos diferentes em Salvador e na Bahia em relação ao relaxamento do isolamento social para diferentes camadas da população. Na capital, cresceu o número dos que disseram que os mais jovens deveriam voltar ao trabalho, com máscaras (de 20% para 29%). Já no estado, houve queda de 40% para 29%.

A defesa maior pelo isolamento social amplo entre os baianos pode também estar relacionada ao crescimento (ainda leve) daqueles que dizem ter sido infectados ou conhecer alguém próximo que ficou doente por causa do coronavírus. Eram 7% há duas semanas e agora são 9%. No Brasil, esse índice dobrou, passando de 8% para 16%. Já em Salvador, houve pequena queda, de 9% para 6%.

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